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Corte chilena determina que o clã Pinochet devolva dinheiro desviado pelo ditador para o exterior

  • Publicado: Quinta, 05 de Julho de 2018, 14h54
  • Última atualização em Quinta, 05 de Julho de 2018, 14h54
A Corte chilena confisca US$ 5 milhões de clã Pinochet ao reconhecer que vinham de cofres públicos, sepultando a fama de honesto do general

ARIEL PALACIOS
04/07/2018 - 08h00 - Atualizado 04/07/2018 08h

]O general Augusto Pinochet governou o Chile entre 1973 e 1990, em ditadura responsável pela morte ou desaparecimento de 4 mil pessoas, e manteve milhões de dólares no exterior (Foto: GREG SMITH/CORBIS/GETTY IMAGES)

Quando, em dezembro de 2006, o ex-ditador e general Augusto José Ramón Pinochet Ugarte “estava ficando com cheiro de gladíolos” — expressão popular chilena para indicar que a morte é iminente —, a imagem pública do autocrata que havia comandado o país com mão de ferro entre 1973 e 1990 era basicamente a de um sanguinário general que havia violado direitos humanos a granel — fato criticado por uns, aplaudido por outros. Mas, na mesma época de seu falecimento, seu curriculum vitae teve um update com a inclusão de uma série de dados que comprovavam que Pinochet também havia sido protagonista de uma miríade de casos de corrupção, pondo a pique o mito de “homem sóbrio e honesto”.

Um de seus vários affaires foi o Caso Riggs, denominação da descoberta de 125 contas bancárias que o ex-ditador tinha aberto com diversos passaportes com sua foto e impressão digital — embora com nomes falsos — no Riggs Bank dos Estados Unidos. Há poucos dias, após longos anos de investigações e idas de vindas nos tribunais, a Corte Suprema de Justiça determinou que o ex-ditador “subtraiu dos fundos públicos”, para “aumentar de forma ilegítima o patrimônio”. A Corte revogou o parecer do juiz Manuel Valderrama, que indicara que a obrigação penal havia sido extinta com a morte do acusado. Segundo o Supremo, o clã Pinochet terá de devolver ao Fisco o dinheiro roubado pelo ex-ditador. Dessa forma, a Corte ordenou o confisco de contas bancárias e imóveis pelo valor de US$ 5,1 milhões.

Apesar da decisão, os integrantes do clã Pinochet não ficarão “patos” — expressão chilena para “ficar sem dinheiro” —, já que a fortuna do patriarca alcançava a faixa dos US$ 21,32 milhões. Desse total, US$ 17,86 milhões — entre os quais estão as contas do Caso Riggs — não possuem justificativas contábeis e estão sendo investigados por diversos tribunais.

A ditadura de Pinochet começou em 11 de setembro de 1973, quando o general comandou um golpe militar que incluiu o bombardeio do Palácio de La Moneda, sede do governo, onde estava o presidente civil Salvador Allende. O palácio ficou semidestruído, provocando a perda de documentos históricos e obras de arte. Naquele dia, para não ser aprisionado pelos golpistas, Allende suicidou-se.

Nos 17 anos seguintes, a ditadura militar assassinou 3.200 civis, e outros 1.200 continuam desaparecidos. O regime torturou mais de 30 mil pessoas, incluindo crianças. Os militares chilenos aplicaram requintes de sadismo com seus prisioneiros, até mesmo com o uso de cachorros de grande porte para violar mulheres que eram críticas do regime. Nos últimos anos, com a revisão dos crimes de Pinochet e seus oficiais, mais de 700 ex-integrantes da ditadura foram processados na Justiça.

A imagem de Pinochet, cada vez pior e com menos defensores no Chile, está levando o UDI, partido de direita que desde a volta da democracia sempre respaldou o ex-ditador, elogiando-o de forma quase permanente —, a se afastar da figura do protagonista da mais dura ditadura da história chilena. Nos últimos anos, as fotos de Pinochet vieram sendo removidas gradualmente das paredes da sede partidária, até não sobrar imagem alguma. Agora, a presidente do UDI, Jacqueline van Rysselberghe, sustenta que é preciso “adequar” a identidade do partido “aos novos tempos”. Por isso, pretende eliminar da declaração de princípios do partido qualquer referência à derrubada do presidente Allende e à chegada de Pinochet ao poder.

A ex-primeira-dama da ditadura Lucía Hiriart também está sendo investigada na Justiça. Hiriart, que tem 96 anos e reside em Santiago, comandou durante quase três décadas a Fundação Cema-Chile, que nos anos 1980 recebeu da ditadura 286 imóveis sem nada pagar em troca. Muitos historiadores e políticos sustentam que Hiriart estimulava Pinochet a passar por cima das leis.

Segundo o escritor argentino Juan Gasparini, autor de Mulheres de ditadores, Hiriart, que era filha de um senador, incentivava o marido a buscar mais poder. Antes do golpe, ela jogava na cara de Pinochet que poderia estar melhor de vida e com mais poder se não tivesse se casado com ele. Pinochet retrucava dizendo que ele poderia chegar a ser um dia ministro da Defesa. Hiriart respondia aos gritos: “Ministro não! Você tem de ser presidente!”.

Uma noite, dias antes do golpe, quando o general hesitava em aderir à rebelião que estava sendo organizada pelas Forças Armadas, mais especificamente, pela Marinha, Hiriart segurou seu marido pelo braço e disparou: “Você é um covarde. Nosso filhos vão acabar vivendo sob o comunismo!”. Pinochet, que era o chefe do Exército, respondeu-lhe que não a decepcionaria.

Muitos anos depois do golpe, o regime planejou o plebiscito de 1988, no qual os chilenos tinham de dar um “não” a Pinochet ou votar “sim” e aceitá-lo até 1997. A ideia do plebiscito havia sido elaborada por Hiriart dois anos antes. Nas eleições de 1990, ela até analisou a possibilidade de candidatar-se à Presidência da República como forma de continuar no poder. Ao longo das últimas décadas proferiu frases como: “Não há fome no Chile. Se um adulto pode comer uma vez por dia, é mais do que suficiente”.

Fonte: Época, 04/07/2018
Disponível em: https://epoca.globo.com/mundo/noticia/2018/07/corte-chilena-determina-que-o-cla-pinochet-devolva-dinheiro-desviado-pelo-ditador-para-o-exterior.html

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