'O afeto familiar entre dois brasis', destaca crítica sobre Construindo Pontes
19/04 às 14h52
COTAÇÃO: ** (Regular)
Jornal do BrasilANA RODRIGUES* Especial para o JB
Na memória de um passado submerso do Brasil e que insiste em bater na nossa porta, a diretora Heloísa Passos concebeu o documentário “Construindo Pontes”. Ao ganhar de presente uma coleção de filmes em Super-8 com imagens do patrimônio natural das Sete Quedas, no Paraná, destruído nos anos 1980 para a construção de Itaipu, maior usina hidrelétrica do mundo, a diretora não só reconstrói pedaços de memória visual do país, mas da sua história pessoal, em particular com seu pai. O engenheiro Álvaro viveu o auge da carreira na ditadura militar, participando de importantes obras. Era a época das grandes construções de inspiração no nacional desenvolvimentismo difundido pelo Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb). Rodovias, usinas e pontes para “um país que se agiganta”.
Para traduzir em imagens a desolação na área de Itaipu, a diretora, que também assina a fotografia, consegue capturar um cenário semelhante a uma ficção científica. Efeitos sonoros acentuam com eficiência um país oprimido, submerso. Imagens do período militar e do “supremo mandatário da Nação, Costa e Silva” nos remetem a um Brasil onde o poder absoluto ignorou a cidadania e suas verdadeiras necessidades.
É na transição entre essa memória e os dias atuais de polarização da política nacional que encontramos Heloísa e Álvaro. Nos diálogos de pai e filha, ele é técnico, passivo e conformado e ela é artista, explosiva e questionadora. Personagens de dois brasis que se completam e se confrontam. Esse ajuste de contas funciona como um retrato de visões de mundo antagônicas, que provocam reflexão. Mas, após discussões acaloradas, a câmera passeia com afeto pelo rosto de Álvaro.
O filme perde de ritmo na segunda metade, quando pai e filha planejam uma road trip. A viagem tem resultado narrativo tímido para o que prometia. No entanto, diretora de fotografia experiente com trabalhos como o aclamado “Lixo extraordinário”, Passos apresenta um belo desfecho, capturando uma estrada de ferro e a passagem do trem entre a luz solar. Ao documentar sua memória pessoal e do país, Heloísa Passos presta uma homenagem familiar e focaliza crises de gerações com momentos delicados.
* Ana Rodrigues é membro da ACCRJ
Fonte: Jornal do Brasil, 19/04/2018
Disponível em: http://www.jb.com.br/cultura/noticias/2018/04/19/o-afeto-familiar-entre-dois-brasis-destaca-critica-sobre-construindo-pontes/
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