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Índios lutam na Justiça por reparação décadas após genocídio em obra da BR-174 no AM

  • Publicado: Quinta, 19 de Abril de 2018, 17h12
  • Última atualização em Quinta, 19 de Abril de 2018, 17h12
Indígenas Waimiri-Atroari foram mortos e expulsos de terras para construção da rodovia federal.

 

Por Adneison Severiano, G1 AM

 

 
População Waimiri-Atroari foi morta nas décadas de 1970 e 1980 (Foto: Ascom/MPF)
 
Um dos maiores episódios de violações aos direitos indígenas registrados no Brasil ocorreu no Amazonas entre 1970 e 1980. O genocídio de mais de 2,6 mil índios Waimiri-Atroari na construção da rodovia BR-174 foi reconhecido pela Justiça Federal. Após décadas, eles lutam por reparação e temem ameaças ainda presentes.
 
Em agosto do ano passado, uma ação foi ajuizada pelo Ministério Público Federal para buscar o reconhecimento e a reparação dos danos causados, por meio de indenização no valor de R$ 50 milhões.
 
O órgão exigiu um pedido oficial de desculpas, inclusão do estudo das violações sofridas pelos indígenas nos conteúdos programáticos escolares e requereu também garantias de direitos para que tais episódios não se repitam.
 
A Justiça reconheceu, em janeiro deste ano, as violações sofridas pelo povo indígenas. Em março, lideranças indígenas apresentaram mapa à Justiça com locais considerados sagrados pelos indígenas, durante audiência determinada em decisão judicial. A maior parte dos locais apontados foi palco de massacres durante a abertura da BR-174, no período da ditadura militar.
 
A Justiça concedeu prazo de 60 dias para que as lideranças reúnam suas aldeias e decidam, entre si, se os espaços sagrados serão indicados por placas nominais ou marcos, além da indicação no mapa já elaborado. O desejo dos indígenas é proteger essas áreas e impedir qualquer interferência não consentida por eles. O mérito que trata do pedido de indenização ainda não foi julgado.
 
“Nosso papel é valorizar a memória, a Justiça e buscar reparações. A ação ajuda nesse papel. É uma questão que vai muito além da indenização. Tem outros pedidos como alteração do decreto que estabeleceu o território Waimiri-Atroari, mas que excluiu a estrada. Esse aspecto é importante para os índios e a garantia de não repetição de realização de empreendimentos sem consentimento”, avaliou o procurador Julio Araújo.
 
Levantamento
O Ministério Público Federal (MPF) fez um levantamento sobre o povo e sua história, marcada por violações e impedimentos do livre exercício de sua identidade. A rodovia federal que liga Manaus a Boa Vista (RR) provocou mudanças radicais nas tradições e no território do povo Waimiri-Atroari.
 

Em 145 páginas, os procuradores do GT Povos Indígenas e Regime Militar mostram os impactos da construção da BR-174 na organização e no território do povo Kinja, bem como o genocídio praticado contra os índios durante a Ditadura Militar. Os apontamentos das violações são com base em documentos, relatórios e depoimentos colhidos durante a apuração do caso.
 
O relatório da Comissão Nacional da Verdade aponta que houve uma redução de 3 mil, na década de 1970, para apenas 332 indígenas vivos na década de 1980, período de maior atividade do empreendimento de construção da rodovia.
 
Segundo o MPF, há provas que demonstram que o Estado brasileiro promoveu ações baseadas nas políticas de contato e de ataques diretos aos indígenas, que causaram a redução demográfica do povo Waimiri-Atroari em larga escala.
 
No período de construção da estrada, o MPF aponta a existência de duas visões sobre a forma como o governo brasileiro deveria lidar com povos indígenas: a “pacificação” e o extermínio.
 
De acordo com Ministério Público, os indígenas eram vistos como um empecilho ao desenvolvimento nacional, cabendo às chamadas frentes de atração promover o deslocamento forçado de seus territórios, afastando-os dos empreendimentos que seriam realizados.
 
No caso da BR-174, os documentos e depoimentos coletados demonstram que a “pacificação” foi insuficiente, devido à pressa em finalizar a obra, à insistência por parte do regime militar em manter o trajeto e à forte resistência indígena.
 
BR-174 no Amazonas cortar terra indígena e índios buscam retomada da área  (Foto: Adneison Severiano/G1 AM)
 
Segundo o MPF, o insucesso do procedimento resultou no acirramento das tensões e o Exército assumiu as operações, oficializando a segunda política: de extermínio. Uma das provas de que houve ordem governamental para ação militar contra os índios é um ofício entre comandantes militares. No documento, as ordens são claras:
 
"Realizar pequenas demonstrações de força, para mostrar os efeitos de uma rajada de metralhadora, de granadas defensivas e da destruição pelo uso da dinamite”.

Os depoimentos colhidos pelo MPF apontam que corpos de indígenas foram enterrados às margens da estrada e ataques aéreos às aldeias foram realizados.
 
“As provas coligidas na apuração demonstram que o Estado brasileiro patrocinou a invasão do território indígena e promoveu a redução da população Kinja [Waimiri-Atroari], de forma violenta, não medindo esforços para realizar o seu genocídio. Os documentos colhidos – relatórios, ofícios, diretrizes –, os depoimentos de pessoas envolvidas com a obra e as memórias dos indígenas permitem reconstituir fatos que estavam marcados por silêncio, esquecimento e mistério. Constata-se que, pelo menos, desde 1974 havia uma ação genocida do Estado brasileiro de ataques violentos, por bombas, tiros e torturas”, afirma o grupo de procuradores no relatório da ação.
 
Fonte: G1 AM, 19/04/2018
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