Derrubada ao chão pelos militares, dança fez solo triste nos anos 1960
Os estragos que a ditadura militar fez numa Brasília em diálogo com as artes retardaram por uma década as experiências com a dança moderna nos anos 1960. A destruição do projeto livre da Universidade de Brasília (UnB), a partir de 1964, pôs por terra a criação de uma Faculdade de Música e Dança.
Invadida, cercada, com professores demitidos e exilados, a UnB foi brutalmente interrompida e o projeto que poderia ter sido um terreiro de criação fértil para a dança da capital, jogado no lixo. Só agora, nos anos 2000, a cidade ganhou um curso superior específico na área de dança (no Instituto Federal do Brasília – IFB, em licenciatura).
A ditadura interrompeu também a criação de um Corpo de Baile estável na capital federal. Estava à frente do projeto Gisèle Santoro (foto de destaque), bailarina que dançou na inauguração da cidade. Casada com o maestro Cláudio Santoro, a jovem entusiasta desenhou um projeto para oferecer aulas de dança em escolas públicas.
Chegou a organizar uma audição para bailarinos e professores para a futura Escola Oficial de Dança. Mas, no dia do teste, coincidentemente, o aeroporto de Brasília foi fechado pelas Forças Armadas, impedindo a chegada de vários inscritos. Participaram somente bailarinas residentes da cidade, como Norma Líllia e Lúcia Toller. Tempos depois, Gisèle e o maestro Cláudio Santoro foram para o exílio, na Alemanha.
O concurso foi cancelado. Norma Líllia e Lúcia Toller tornam-se protagonistas da história ao assumir um importante papel de formação. Se o teatro moderno estava de alguma forma rompendo as brechas com Sylvia Orthof, a dança, em Brasília, assumiu um campo pedagógico de formação. Não há registros de espetáculos que se diferenciavam na imprensa da cidade na década de 1960. Era um solo triste para a dança moderna.
Importantes nomes da cena vieram a Brasília graças às duas professoras. Essa formação continuada permitiu que se ampliasse o circuito de academias de danças e o surgimento de bailarinos que seguiram carreira fora da capital.
Lúcia Toller, por exemplo, investiu numa academia de cursos diversificados, extrapolando o clássico. A chegada de Hugo Rodas, na década de 1970, tem relação direta com essa ponte formada pela Academia Lúcia Toller com o país. Graças ao convite de Toller, Hugo Rodas veio de Salvador para Brasília e daqui numa mais saiu.
Norma Lillia teve um papel que ultrapassou as dependências da academia. Ela desenvolveu a primeira companhia profissional de dança da cidade: o Grupo Brasiliense de Balé (1972-1993), que criava repertório original de balé clássico e circulou o país. Da criadora, também nasceu o Curso Técnico de Formação em Dança, reconhecido pelo MEC e com sete mil alunos, funcionando por sete anos.
FONTES:
Acervo do Correio Braziliense
“A História que se dança – Yara de Cunto e Susi Martinelli
“A Paixão de Honestino”, de Betty Almeida
“Histórias do Teatro Brasiliense”, de Fernando Pinheiro Villar e Eliezer Faleiros de Carvalho
“Panorama do Teatro Brasiliense em 1968”, artigo de Carlos Mateus de Costa Castello Branco, publicado na revista Intercâmbio
“A Cidade Teatralizada”, de Celso Araújo
“Educação Pela Arte: o Caso Brasília”, de Maria Duarte de Souza
Fonte: Metrópoles, 03/06/2017
Disponível: http://www.metropoles.com/colunas-blogs/tipo-assim/derrubada-ao-chao-pelos-militares-danca-fez-solo-triste-nos-anos-1960
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