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50 anos da morte de Castello Branco

  • Publicado: Terça, 01 de Agosto de 2017, 16h10
  • Última atualização em Terça, 01 de Agosto de 2017, 16h11
31
JUL
2017

50 ANOS DA MORTE DE CASTELLO BRANCO


 

No dia 18 de julho de 1967, o avião em que Humberto de Alencar Castello Branco viajava se chocou com um jato da FAB pouco antes de pousar no aeroporto de Fortaleza. Todos os ocupantes da aeronave morreram, exceto o copiloto. No dia seguinte, jornais de todo o Brasil publicaram obituários e declarações de personalidades a respeito do primeiro presidente do regime militar. Ao Correio da Manhã, o ex-embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon, teria dito que Castello “será reivindicado pela História como um dos maiores presidentes do nosso tempo no hemisfério ocidental”. Era o início da operação de “panteonização” de Castello Branco.

De fato, brasilianistas começaram a difundir uma memória de Castello Branco como um presidente intelectual, defensor da hierarquia e da disciplina, democrata, legalista e moderado. Pode-se dizer que o maior nome dessa operação foi o historiador norte-americano John W.F. Dulles, que escreveu uma biografia de dois volumes sobre a vida do marechal.

O ex-presidente Jânio Quadros, que teve seus direitos políticos cassados durante o governo de Castello Branco, veio a público afirmar que “o presidente morreu quando a opinião nacional começaria a julgar os atos de sua administração”. Tal declaração não corresponde aos fatos: Castello já havia sido julgado. Ele terminou seu governo com uma forte impopularidade. Seu pacote de ajuste econômico desagradou às classes médias, a parte do empresariado e, especialmente, aos mais humildes, atingidos pelo aumento do custo de vida e pelo arrocho salarial.

Entre os militares, Castello sofreu forte oposição de membros da Marinha e da Aeronáutica, que disputavam o controle da aviação embarcada no porta-aviões Minas Gerais, comprado durante o governo de Juscelino Kubitschek. Além disso, dentro do Exército, grupos contrários à política de Castello foram uma constante ameaça à estabilidade de um governo que acabara de se estabelecer por meio de uma “Revolução”.

Nos jornais, Castello Branco fazia a alegria dos chargistas que adoravam desenhá-lo com um presidente atarracado, sem pescoço e cabeçudo. As críticas não eram gratuitas: setores da sociedade não perdoavam as constantes viradas de mesa e mudanças de leis e regras operadas pelos donos do poder, muitas delas de forma casuística e nitidamente prejudiciais aos opositores do regime. Parte dos políticos que desejavam o retorno dos militares a um papel secundário também mostrava forte descontentamento. Uma das formas de calar algumas dessas vozes foi a edição da Lei de Imprensa, no apagar das luzes do governo de Castello Branco.

No dia seguinte à morte do ex-presidente, Jânio Quadros dizia que “difícil agora é julgar Castello”. Para Jânio, valia a máxima brasileira de que “morreu, virou santo”. Talvez a morte prematura e traumática de Castello Branco tenha efetivamente contribuído para que os aspectos negativos de seu governo fossem esquecidos ou diminuídos, enquanto visões positivas do ex-presidente eram reafirmadas de tempos em tempos. Muitos de seus opositores, civis e militares, o elogiaram publicamente em uma série de reportagens após sua morte.

Mais tarde, a partir da ascensão de Ernesto Geisel à presidência do Brasil em 1974, membro do grupo castellista, o processo de reabilitação da figura de Castello Branco foi conectado ao projeto de abertura “lenta, segura e gradual” do regime militar. Associar o ex-presidente à moderação e opor sua figura à linha-dura passou a ser, a partir de então, parte de um projeto político.

Há poucos anos, Castello Branco voltou a ser elogiado por membros do Exército. Em 2005, ano do centenário da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), a instituição foi oficialmente renomeada “Escola Marechal Castello Branco”. Na sua biblioteca, há uma exposição permanente, contendo todo o acervo documental da produção acadêmica do Marechal, ficando ele retratado como uma espécie de patrono da escola, que teria dedicado 13 anos de sua carreira militar à sua melhoria.

Na ECEME, fica evidente a valorização da liderança, hierarquia, disciplina e, principalmente, do esforço intelectual de Castello Branco, identificado como um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento pioneiro de uma doutrina militar brasileira. Outra notícia recente foi o elogio do atual Comandante do Exército, General Eduardo Villas Bôas, que tuitou “Marechal Castello Branco, um exemplo de líder militar a ser seguido. #ObrigadoSoldado!”. A nota foi divulgada no mesmo momento em que o Exército anunciou oficialmente a recuperação e digitalização do arquivo do marechal, depositado na ECEME.[1]

“O morto esquecido é o único que repousa em paz”, teria dito Nelson Rodrigues. Ao que tudo indica, ainda falta muito para que o velho marechal seja esquecido, tanto nos quartéis quanto nas salas de aula. De qual Castello Branco nos lembraremos amanhã?

 

Daniel Accioly é professor de História e historiador.

Fonte: História da Ditadura, 31/07/2017

Disponível: http://historiadaditadura.com.br/destaque/50-anos-da-morte-de-castello-branco/

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